O SONHO DESFEITO DO OLEIRO ANTÓNIO DO GAIO

 

António Abegão, 72 anos, Oleiro de profissão, residente me Turquel no lugar do Moniz. Das suas mãos nascem obras-primas de barro, peças dignas de exposição permanente. O sonho dum Museu em Turquel, ao qual oferecia todas as suas obras, parece irremediavelmente perdido. 

Cabe-nos a nós pensar: De quem é a culpa? – Das sucessivas presidências de Turquel? – Da população de Turquel em Geral ? ..... Creio que a todos nós nos toca um pouco da responsabilidade.

As sucessivas Juntas de Freguesia, talvez por falta de meios, nada têm feito referente  à  questão do museu. Mas, o povo de Turquel – que deveria ser a principal entidade interessada – ou desconhece, ou ignora a obra do oleiro artista.

 Perigo

A verdade é que existe um espólio valorosíssimo – nascido das mãos do Sr. António Abegão – que corre um sério risco de mudar de freguesia, e talvez até de concelho. Se isso vier a acontecer, seremos todos nós ( população de Turquel; Junta  de Freguesia; e Câmara Municipal de Alcobaça) os principais culpados do sucedido.

Então, nessa altura, Turquel ficará – sem se aperceber – mais pobre artística e culturalmente. Para nós, turquelenses, isso parece até nem ser importante. Já estamos habituados. De um modo geral, todo o nosso  património tem sofrido grandes lapidações ao longo dos tempos. E nós nada  fazemos para contrariar essa tendência. Apenas lamentamos as sucessivas “golpadas” na nossa riqueza. 

Sonho desfeito

“ – O que eu pretendia fazer em Turquel era um Museu”. Nesta frase, António do Gaio ( tal com é conhecido do passado: “pretendia” e “era”. Significa isto que já desistiu da ideia? Infelizmente parece que sim. Foram  já muitos os inglórios, pela realização do Projecto Museu. Por isso, vive agora uma vida na amargura por não conseguir dar um sentido de realização às obras da sua vida.

Para o Museu chegou a idealizar um local, era a antiga casa do Capitão Silva Mendes, pelo que apanhou uma grande decepção quando soube que o local já tinha sido vendido a um particular.

 Promessas da Câmara de Alcobaça

Há cinco anos atrás, concluiu que Turquel nada fazia e pensou em Alcobaça.

Disse-nos que a CMA, na pessoa do Sr. Miguel Guerra, fez-lhe algumas promessa: “O Sr. Miguel Guerra disse-me que o Museu iria ser feito na Central (eléctrica) velha de Alcobaça (entrada da cidade).  Passou-se mais algum tempo, alguns meses, eu voltei lá e acontece que ele (Miguel Guerra) me diz que afinal o Museu já não iria ser na Central porque a Câmara tinha, então, 20 mil contos para o museu. Foi uma noticia maravilhosa!”

Entretanto, como nada de concreto se fazia, o Sr. Abegão continuava a dirigir-se para a CMA para falar com o Sr. Presidente Sr. Miguel Guerra lhe diz que afinal o Museu iria ser feito não em Alcobaça, mas antes no cimo da serra , em Casais Vale de Ventos.

Esta novidade foi muito mal recebida  pelo Sr. Abegão. É da opinião que o Sr. Miguel Guerra deveria-o ter consultado primeiro, para saber se o artesão estava de acordo com a deslocação das peças para a serra. Disse: “- Eu é que ia expor as peças. As peças não eram vendidas, ...... eram dadas! Só que tinha-se que fazer um documento em como ninguém ( fosse quem fosse) poderia tirara as peças[....] num os meus familiares ( descendentes) as poderiam tirar”.

Agora “quando vi que aqui nada faziam, fui para Rio Maior”, disse.

 Profissão – Coveiro

Esteve seis (quase sete) anos a trabalhar no cemitério de Turquel. “ Trabalhei muito para o cemitério. Quando para lá entrei, o cemitério era uma mata autêntica! Eu queria fazer do cemitério de Turquel, como não houve nenhum no concelho de Alcobaça [...] Aos Domingos e mesmo feriados, eu ia para lá” disse-nos.

Projecto Turquel

Durante seis anos, tomou conta do moinho de vento situado no lugar de Moinhos de Turquel.

O Projecto Turístico parecia ganhar forma. Diz-nos que chegaram a vir pessoas de Lisboa, de propósito para o Projecto em causa. Mas, a Junta de Freguesia de então, não se interessou pelo assunto.

Sente-se, contudo marginalizado por (ainda) não lhe terem atribuído uma pensão de reforma relativo ao período de tempo que trabalhou no cemitério. Em virtude disso, o Sr. Abegão sentiu-se indignado e “destruiu” o moinho que já era um ex-libris de Turquel.

“destruiu” o moinho onde ( há dez anos) tinha gasto setecentos contos na reparação, ou seja retirou tudo o que lhe havia acrescentado.

O moinho de vento estava incluído num projecto de futuro, e que não tinha perspectivas de concretização pela ausência de apoios locais. O Sr. Abegão, contrariado, decidiu ele mesmo por termo à actividade do moinho.

Doze anos de trabalho

O Sr. Abegão começou a trabalhar o barro aos treze anos de idade, todo o seu espólio é, actualmente, constituído por várias centenas de peças de cerâmica (muitas únicas) e várias maquetas de madeira. Tudo feito à mão. E que representam mais de doze anos de trabalho da sua vida. Peças, que António Abegão não vende por nada deste mundo.

Cada peça cada história

À medida que nos vai mostrando a sua obra (constituída por centenas de exemplares), vai pegando aleatoriamente nas peças, explicando o significado e especificidade de cada uma.

Casa pela tem uma história e uma razão de ser única e individual, que o Sr. António Abegão nos conta com o maior dos prazeres à medida que vamos percorrendo o seu armazém improvisado e completamente cheio.

Colecções

Andou mais de doze nos a fazer peças e a colocá-las nas prateleiras, sempre com intuito de um dia se escolher uma de cada – ou colecções completas – para expor num museu idealizado por si.

Uma colecção é constituída pelos vários tamanhos de cada modelo. “ Existem colecções de dez peças” diz-nos. Há peças especificas em que são necessários os seus vários tamanhos para representar o seu historial especifico. No Museu, seriam, então, expostos vários centos de peças.

Maquetas de capelas e de igrejas

Na sua sala de exposições, depara-mos com seis maquetas que são autênticas obras-primas, todas feitas à mão e trabalhadas em madeira.

As maquetas são representações reduzidas seguintes capelas e igrejas:

a)       Capela (de 1624) do Silval

b)       Capela de Santo António, Turquel;

c)       Capela do Sr. Jesus, de Turquel;

d)       Igreja de Turquel;

e)       Antiga Igreja da Bendita (hoje inexistente);

f)        Antiga Igreja do Vimeiro.

As diversas maquetas representam, de forma reduzida, as edificações na sua linha original e antes das várias remodelações que têm sofrido ao longo dos tempos. Pode-se considerar que se trata duma obra inédita e investida dum importância histórica fabulosa.

As diversas maquetas representam, de forma reduzida, as edificações na sua linha original e antes das várias remodelações que têm sofrido ao longo dos tempos. Pode-se considerar que se trata duma obra inédita e investida dum importância histórica fabulosa.

  As diversas maquetas representam, de forma reduzida, as edificações na sua linha original e antes das várias remodelações que têm sofrido ao longo dos tempos. Pode-se considerar que se trata duma obra inédita e investida dum importância histórica fabulosa.

À parte destas seis maquetas, existe uma outra, nas suas palavras: “trata-se, dum residência muito pobre, não tem cantarias, não tem vidros, nem havia alguidar para amassar o pão[...] Não queria deixar de a fazer. Sonhava com ...... É a casa onde nasci”

Assim como também nos diz que não poderia deixar de fazer a maqueta da antiga Igreja do Vimeiro, por Ter sido o local onde foi baptizado. Contou-nos: “Já disse à neta, estas duas coisas nunca as vendas, as outras podes até vender ,..., mas nunca venda, fica sempre com elas”.

A terminar, o Sr. Abegão disse-nos que por essas seis maquetas, não as vende nem por três mil contos.”

 

 Jornal de Turquel, Ano 5, Numero 52, 8 de Setembro de 1995